terça-feira, 7 de junho de 2011

Coronel João Monteiro/Capítulo II - A guerra de 7 de junho: Carlos Gomes Jr., Zamora Induta, Luis Amado e Jaime Gama, José Eduardo dos Santos,

Entrevista a João Monteiro: um esclarecimento do Coronel Afonso Té

"Caro Aly. Tudo bem?

Se me permitires, gostaria de trazer alguns elementos relacionados com a entrevista do Coronel João Monteiro no Ditadura do Consenso.

Na noite em que o General Tagme foi assassinado, preocupado, entrei em contacto com Coronel João Monteiro e ele deu-me a sua coordenada: Estava na residência do General 'Nino' Vieira e fui ter com ele. Disse-me que aquele o tinha mandado buscar porque constou-lhe que o General Tagme teria sido assassinado. Muito preocupado e incrédulo, perguntou-me porque teriam feito isso? E depois disse-me: olha, isto vai dar bronca. É preciso que o Presidente saia da sua residência, mas ele insiste em ficar.

Ele, já não estava ligado à segurança do Presidente e eu já não estava nas Forças Armadas, pelo que, pese embora reconhecessemos que a situação de risco era por demais evidente, estávamos limitados. Ficamos juntos por um tempo e depois pediu-me para levar-lhe a casa para ele poder jantar e voltar. Assim fiz. Fui com ele, jantamos e saímos juntos.

No caminho, de regresso à casa do General Vieira, fomos informados de que um grupo de veículos dupla cabine, cheio de militares dirigia-se para a casa dele (do Presidente). Fomos directamente para lá.

Quando chegamos constatamos que tinha sido o Presidente quem convocou uma reunião de emergência com as Chefias Militares e que já estava no fim. Eu ainda vi o dispositivo de segurança montado. Havia duas cinturas no perímetro. Aparentemente estava tudo bem. O Coronel João Monteiro entrou e eu deixei-o tendo continuado a circular. Foi assim que comecei a coletar dados para poder melhor entender o que se passou no Estado Maior-General e tirar ilações.

Nisto, fui informado que havia movimento militar a nível de Safim e do Aeroporto. Chamei o Coronel João Monteiro a quem pus ao corrente prevenindo-o. E conforme a noite avançava as coisas se complicavam pois o movimento intensifica-se enquanto que na Presidência, sede do Batalhão do Palácio a calma se tornava cada vez mais suspeita. Pois era a Unidade que tinha por missão defender o Presidente da República.

Depois os tiros começaram a fazer-se sentir, chamei o Coronel João Monteiro que me disse que a residência do Presidente da República estava sob fogo intenso. Depois perdi o seu contato. Entretanto continuei a circular até que consegui o número do Presidente da República : +245 640 0000 (este foi um dos seus últimos números). Liguei para esse número a pessoa que tinha o telefone respondeu mas não dizia nada. eu disse aló várias vezes mas como ela não respondia fiquei à escuta. Foi assim que ouvi uma voz ao fundo perguntar:"para onde o levas, para onde o levas? Uma segunda voz responde: vou levá-lo Estado Maior". Continuei a escutar mas não havia mais nada de importante cortei a ligação.

Eram mais ou menos 5h da manhã. Fiquei ainda com uma certa esperança de que o Presidente ainda estivesse de vida. Tentei chamar o Coronel João Monteiro, mas continuava com o seu telemóvel fechado.

Às sete da manhã o Coronel João Monteiro chamou-me e quando respondi perguntou-me se ainda havia movimento nos arredores da casa do Presidente ao que respondi que sim. Pois, os militares que estavam envolvidos no assalto ainda estavam no local. Nessa altura ele não me disse que estava ferido e nem perguntei onde estava pois no telefone não devia fazé-lo. Em relação a ele eu pelo menos, fiquei a saber que ainda estava de vida. Também já sabia do assassinato do Presidente da República.

Desligou o telefone e só voltou a chamar-me às nove. Desta vez disse-me que tinha sido ferido e que sangrava. Eu pedi-lhe que ficasse onde estava, que eu ia fazer diligências para tirá-lo dali. Chamei o Coronel Cissé da CEDEAO mas o número que eu tinha não passava. Chamei o Coronel Sandji Fati, que me deu o número do Coronel Marino. Depois chamei o Dr. Aristides que de imediato chamou para a UNOGBIS - eu também chamei - tendo confirmado que já tinham sido chamados tanto pelo Aristides como pelo Dr DiCkson.

Depois destas diligências todas fiz o seguimento da operação de sua exfiltração pela UNOGBIS à distância. E só depois de tudo isto é que fui para a minha casa onde fiquei. Estive em Bissau até depois do enterro a que assisti. Saí de Bissau para Dakar no dia 12 de março de 2009 no voo normal da TACV. No dia 14 do mesmo mês segui para a Índia, que, de resto, era o meu destino e o motivo da minha saída do País.

De regresso a Dakar fui visitar o Coronel João Monteiro pela segunda vez, no Hospital militar Principal. Quando eu lhe disse que regressava a Bissau no dia 21 de Março, ele insistiu que eu não fosse. E tinha razão. Logo depois fui informado de que na Segurança do Estado circulava a informação em como eu estava a comandar uma força que tinha por missão invadir a Guiné-Bissau, a partir de Varela, enquanto que o Coronel João Monteiro comandaria outra, que devia desembarcar em São Domingos.

Mais tarde soube que os agentes da Segurança montavam guarda à minha residência.
Coitado do Coronel João Monteiro: enquanto a Segurança dizia que ele comandava uma força que devia desembarcar em São Domingos, ele estava deitado no Hospital com seis balas no corpo...

Esta foi a razão porque fiquei fiquei em Dakar. Só as especulações continuaram. E em Junho de 2009, soube pela comunicação social que o Helder Proença, o Baciro Dabó mais outras duas pessoas foram assassinadas e que o Dr Faustino Mbali foi detido por uma alegada tentativa de Golpe de Estado em que nós participaríamos. Assim tomei conhecimento da lista de nome de pessoas supostamente envolvidas na tentativa.

Nota: Depois de ler a entrevista, quis aportar as precisões acima.

Coronel António Afonso Té
"

NOTA: Muito obrigado pelo seu esclarecimento. Um abraço, Aly Silva

Coronel João Monteiro/Capítulo II - A guerra de 7 de junho: Carlos Gomes Jr., Zamora Induta, Luis Amado e Jaime Gama, José Eduardo dos Santos, os 'aguentas'

DITADURA DO CONSENSO: Coronel, fale-me da guerra de 7 de junho de 1998. Qual foi o seu papel?

João Monteiro: Na guerra de 7 de junho, eu tinha montado uma barricada no poilão de Brã e a Junta Militar estava do outro lado. Um dia, o Presidente ‘Nino’ chama-me e pede que abra uma frente na zona de Plack 2. Então, eu disse-lhe que se saísse do poilão perderíamos essa posição. Ele insistiu: ‘abre o Plack’. Assim fiz. Então, o actual CEMGFA, António Indjai, na altura na Junta Militar, estancou em Brá. Fui e abri essa zona juntamente com o Nunes Cá, o Indi, o já falecido Marcelino Ramos. Logo no primeiro dia, a Junta Militar sofreu uma pesada derrota.

Chegou a sentir, a dada altura, que podiam ganhar a guerra?

Cheguei a sentir que sim, que essa guerra que nos foi imposta, uma aventura irresponsável, podia ser ganha. Aliás, no dia 31 de janeiro estávamos já com poder suficiente e prontos para tomarmos Brá e a Base-Aérea, mas o Presidente ‘Nino’ disse que não, que o Jaime Gama estava para chegar. E eu disse-lhe ‘e quem é o Jaime Gama? Ainda que fosse o Mário Soares, isto é uma guerra!’ E disse aos senegaleses para dispararem mas o Kony disse que havia que respeitar a ordem. E como somos militares há que obedecer, pois o Presidente às tantas diz ‘isto é uma ordem’. E como acabou? Perdemos a guerra e agora havia que negociar. Eu sempre disse ao Presidente que para as negociações era perferível a CPLP - que estancaria a Junta em Mansoa para iniciarmos as negociações.

E aparece a CEDEAO como mediadora...

Sim. A CEDEAO adiantou-se e deu no que deu. Por exemplo, o presidente do Senegal, Abdou Diouf, dizia constantemente ao Presidente ‘Nino’ que ‘as tropas senegalesas não abandonariam o País enquanto ele não ganhasse efectivamente a guerra’. E disse mais ao Presidente ‘Nino’, aí, no aeroporto osvaldo Vieira, em Bissau, durante as despedidas: ‘se não tiver cuidado vai perder esta guerra! Com rebeldes não se brinca, nem se deve negociar!’.
Tínhamos 3 peças de canhão de 120mm, acabadas de chegar do Senegal. Foram montadas e disparamos apenas 3 obuses e o ‘Nino’ opôs-se logo ao seu uso, dizendo que ‘aquilo não era arma para ser usada numa guerra’. Respondi ao Presidente dizendo-lhe que estávamos a ser fustigados por mísseis BM-21 (Katiushka). Ele foi firme: ‘isto é uma guerra entre irmãos e essa arma é medonha? Desmontou-se tudo, reembarcou-se no navio, e assim voltaram aquelas três peças de canhão para o Senegal.

Coronel, conheceu o Zamora Induta?

Não o conhecia, para lhe dizer a verdade. E não sei que ódio moveu o Zamora contra o ‘Nino’ Vieira, contra a minha pessoa e contra a Guiné-Bissau. O Zamora, na guerra de 7 de junho, andou fugido com mais pessoas. Então eu chamei o Watna, que é piloto, e disse-lhe: ‘ouve, tu és militar e há uma guerra e tu estás aqui. O que se passa?’ Ele respondeu dizendo que nem sabia para que lado é que devia ir, que os colegas tinham ficado na Base. Retorqui que não, que os seus colegas tinham saído da base. Então disse que não iria à Base, pois corria o risco de ser abatido. Alegou que não sabia como estava o centro de Bissau. Levei-o comigo. O Zamora foi logo dizer que eu prendi-o e quis matá-lo. Que assim que caiu um obus ele conseguiu escapar...que bandido, este! Alguém que eu nem conhecia! O Watna foi testemunha disto. A partir daí o Zamora começou a olhar para mim como um inimigo.

E depois reaparece, mas na Junta Militar...

Sim. Assim que ouvi falar no nome dele, disse logo para mim que o Zamora tinha algo contra o ‘Nino’ Vieira. Aconteceu outra coisa estranha. Um dia, o Presidente ‘Nino’ ia para França, via Lisboa, e para seu espanto viu o Zamora sentado dentro do avião. E pergunta-lhe ‘o que fazes aqui?’ – Zamora estava com o Luis Amado (actual ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal) a conversar. Zamora responde, visivelmente embaraçado e desconfortável, dizendo que ‘ia a Bruxelas’. O ‘Nino’ voltou à carga: ‘e quem é que te deu licença para ir a Bruxelas? Conheces por acaso o Luis Amado, para estarem na conversa?’. Disse-o à frente do Luis Amado para este ouvir e ouviu muito bem... E ‘Nino’ disse-me depois que tinha quase a certeza de que Zamora Induta estava a esconder qualquer coisa...

Acha que Portugal teve uma ‘mãozinha’ na morte do 'Nino' Vieira?

Não posso dizer isso, mas as declarações do Presidente Mário Soares - ‘Nino era um homem violento e morreu com violência’, deixa entender que há mão oculta, portuguesa, na morte do Presidente da República João Bernardo ‘Nino’ Vieira. Ouvi igualmente o Presidente angolano José Eduardo dos Santos, que falava ao lado do seu homólogo Cavaco Silva, em Lisboa, dizer que a morte do Presidente ‘Nino’ ‘não ficaria em vão, que tinha que ser esclarecida’. Fiquei assim, se saber...

Tem esperança de que um dia o assassinato do Presidente ‘Nino’ Vieira venha a ser cabalmente esclarecido?

Não posso dizer que tenho esperança, não vejo é quem vai resolver isso.... Fui ouvido em Dakar e garantiram-me que em Setembro haverá Justiça. Eu disse-lhes até que ‘mobilizando-me ou não, tinha de falar! Como vieram até cá vou dizer-vos a verdade’. Depois da morte do Presidente comecei a ouvir dizer na rádio que se tratava de um ajuste de contas, que foi um ‘grupo desconhecido’ e coisas assim. Mas que grupo desconhecido? Um grupo desconhecido não pode atacar a residência de um Presidente da República de maneira desenvolta como fizeram. Agora pergunto apenas isto: e eles, os que guardavam o Presidente em casa, como militares, onde é que estavam?

Por falar nisso, onde é que estava a quase centena de militares que guardava a residência do Presidente?

E é mesmo isso que se deve perguntar. Foram para onde? Olhe, o Manuel Sanca (NOTA: Manuel Sanca era segurança do Presidente ‘Nino’ Vieira. Hoje, faz parte da equipa que ‘guarda’ o Presidente da República, Malam Bacai Sanha) veio um dia a Dakar e visitou-me. Depois do almoço, portanto já relaxados, perguntei-lhe calmamente: ‘Manuel, vocês estavam no passeio, eu vi, estavam todos armados, em prontidão de combate. Para onde é que foram quando começaram os tiros?’. Sabes o que ele me respondeu, assim, friamente?: ‘fugimos’. Eu ripostei irritado - Manuel, tu disseste ao ‘Nino’ à minha frente «esta é a tua cova, esta será a minha». E agora a cova do ‘Nino’ chega e tu foges? Porquê? Isto significa que estavas a enganar o Presidente? Então, começou a chorar. Rematei dizendo que se eu estivesse lá, teria outros homens a guardar o Presidente, que não eles. O Presidente ouvia gente que o enganava... Disse-lhe várias vezes que a sua segurança era um caos, que estava completamente desorganizada, e que um dia haveria uma desgraça...

E houve também aquele problema com o Tagme Na Waie, aquando do desarmamento do pessoal da guarda do Presidente, os chamados ‘aguentas’, criados na guerra de 7 de junho.

A primeira vez que o Tagme mandou desarmá-los, eu disse: ‘camarada Presidente, deixe-se disso. Ele responde ‘tens razão’, mas eu continuei: ‘Eu sinto-me ofendido. Quando é que um militar, ainda que seja o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, pode mandar desarmar uma guarda presidencial da escolha de confiança do Presidente da República, que é também Comandante-em-Chefe das forças frmadas?’ Ele apenas disse, olhando para o lado, ‘deixa estar, deixa estar, não arranjes problemas’.

E você, o que fez?

Durante dois dias não meti os pés no Estado Maior. Até o Tagme mandar chamar-me para saber a razão da minha ausência no trabalho. Disse-lhe apenas que não estava a sentir-me bem. Então comunicou-me que ia ter lugar uma reunião das chefias militares. À frente de todos, nessa reunião, disse-lhe que não tinha ficado satisfeito com essa sua atitude de mandar desarmar a segurança do Presidente. Disse-me que não, que esses miudos tinham disparado contra ele (NOTA: Tagme referia-se aos incidentes na avenida da Presidência da República). Disse-lhe mais: que esses rapazes eram balantas, seus parentes, que disseram em inquérito que só passados 30 minutos é que você chegou lá. Que você quem comunicou à Base Aérea que tinham matado um elemento sa sua escolta. E desafiei o Tagme a dizer, no mei0 de toda aquela gente, que elemento da escolta é que tinha sido morto. Desculpou-se então com uma frase tão velha como o próprio mundo: ‘a informação que foi passada era falsa’... Disse-lhe então que tivesse cuidado com essas coisas.

Acha então que foi tudo bem preparado até se chegar ao assassinato do Presidente ‘Nino’ Vieira?.

Claro que foi tudo bem cozinhado. Aliás, se eu não tivesse sido atingido, aposto que diriam logo ‘foi o João Monteiro que colocou a bomba que matou o Tagme'.

E foi você?!

Olhe, uma senhora, que tem acompanhado e assistido o Barnabé Gomes na sua recuperação (NOTA: Barnabé era assessor de imprensa do Presidente ‘Nino’, e foi ferido com gravidade no atentado do dia 2 de março de 2009, que custou a vida ao Presidente ‘Nino’ Vieira) disse-me um dia que nessa manhã de 2 de março o meu nome já circulava por meia Bissau - que eu é que tinha colocado a bomba que matou o general Tagme Na Waie... Contudo, assim que souberam que tinha sido atingido e estava na sede da ONU, o boato parou... sei bem o que é o trabalho de um sapador. As minhas mão tremem, portanto fica descartada essa hipótese patética.

Já agora, suspeita de alguém?

Um dia, de Bissau, telefona-me o Melcíades Fernandes (NOTA: General, Piloto-Aviador, Melcíades Gomes Fernandes foi um dos elementos da Junta Militar. Chegou a Chefe do Estado-Maior da Força Aére. Esteve preso mais de um ano, acusado de ter colocado a bomba que deflagrara no Estado-Maior, ceifando a vida do general e CEMGFA Tagme Na Waie, no dia 1 de março de 2009) e aproveitei para lhe dizer apenas isto: Olha, eu não sou um bandido. Sou um homem que vai morrer com uma só cara, que não vai mentir para morrer. Pus a verdade à minha esquerda, à minha direita; à minha frente e atrás. Diz-me só isto: por que razão aceitaste carregar esse peso nos teus ombros, o de teres sido tu a colocar a bomba? Manteve-se calado e eu desliguei o telefone. Não me chegou a dizer que tinha sido ele, nem que não.

Mas o que você acha?

Acho sinceramente que o Melcíades Fernandes mentiu. As informações que eu tenho – por exemplo de um patrício que veio de Cabo Verde, contou-me tudo. Se as provas existem, ou não existem isso eu não sei. Não me peçam é para mentir.

‘Nino’ Vieira chegou a sondar líderes da sub-região para ajudar José Eduardo dos Santos a chegar à presidência da União Africana? O que sabe sobre isso?

Assim foi. O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos é que pediu ajuda ao ‘Nino’ Vieira alegando que ele tinha influência na sua zona, mas que era com ‘Nino’ Vieira que contava na sub-região da África Ocidental. O Presidente ‘Nino’ até já tinha entrado em contacto com o presidente da Gâmbia e com presidentes de outros países vizinhos. Acho até que o Yaya Jahmeh levou esse assunto ao conhecimento do Khadaffi, que queria esse cargo mas acabou por perder na votação... não é que esteja a acusar o coronel Khadaffi, mas há muitas mãos ocultas por detrás desse assassinato. Por exemplo, tenho informação de que o Jaime Gama esteve na Gâmbia antes de chegar a Bissau. Para fazer o quê? E por que razão foi o Jaime Gama a Bissau se o Presidente ‘Nino’ não estava no País? Com quem falou? Do que falaram? Foi falar com o Cadogo...

Por falar em Cadogo, que apreciação faz da pessoa do actual Primeiro-Ministro durante essa crise?

O Cadogo (NOTA: Cadogo é o ‘nominho’ por que é conhecido Carlos Gomes Jr., Primeiro-Ministro da Guiné-Bissau) esteve em Dakar várias vezes. E o embaixador Fali (NOTA: Fali Embaló é agora embaixador da Guiné-Bissau em Portugal) disse-lhe ‘o coronel João Monteiro está internado no hospital’. A Isabel Vieira disse-me uma vez que ouviu dizer que o Cadogo viria visitar-me e eu respondi ‘ele que venha. Eu estou aqui deitado e nem me posso levantar. Não posso fugir dele.’ Mas eu nunca cheguei a ver o Cadogo com os meus olhos... se tivesse vindo, as nossas palavras cruzar-se-iam. Se ele me dissesse dez eu dir-lhe-ia vinte... Peço a Deus que nem me venha visitar, porque dizia-lhe na cara aquilo que eu penso que ele fez...

Acha então que o Primeiro-Ministro Carlos Gomes Jr foi responsável pelo assassinato do Presidente ‘Nino’ Vieira?

É responsável, sim! Não sei se foi ele quem matou o ‘Nino’, mas, diga-me uma coisa, você é Primeiro-Ministro e o Presidente da República chama-o. O que você faz? Vai responder, claro. Da segunda vez que o Artur Silva veio à casa do Presidente (NOTA: Artur Silva era, na altura, Ministro da Defesa. Hoje, é titular da pasta da Educação) disse ‘Sr. Presidente, o Primeiro-Ministro diz que não vem porque não tem segurança’. O Lourenço, que morreu nessa noite, disse o mesmo. O Adolfo Martins, também. Então se o Cadogo sabia que alguma estava para acontecer, porque não contou isso ao Chefe de Estado? As suspeitas recaíram desde logo sobre o Cadogo e as suas manobras nessa noite... Deus me perdoe, mas não tiro as mãos do Cadogo nesse assassinato. Várias vezes fez comentários do tipo ‘não coabitarei com um bandido’ (NOTA: Cadogo disse isto em Cabo Verde). E isso quer dizer tudo. Não posso dizer que foi ele a 100 por cento, mas as suas palavras não deixam dúvidas de que tem quota parte da responsabilidade.

CONTINUA...

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