O antigo Presidente interino de 1999/2000 gostaria de dizer que foi com naturalidade que encarou o triunfo sobre Kumba Ialá, “mas não foi". E explica: "O nível de ansiedade era bastante elevado, dado que já tinha experimentado grandes desapontamentos eleitorais [com as derrotas à segunda volta nas presidenciais de 2000 e de 2005].” Passada, porém, a fase da emoção, sentiu “o peso da responsabilidade dos números que lhe dão legitimidade e responsabilidade perante o povo, na mesma proporção”.
PÚBLICO - Confirmada a sua eleição, está pronto a trabalhar lealmente com o Governo saído das legislativas do ano passado?
Malam Bacai Sanhá - A lealdade e a fidúcia são pressupostos constitucionais do regular funcionamento das instituições da república que me caberá garantir. Não vejo quaisquer constrangimentos que possam condicionar o trabalho com o Governo de Carlos Gomes Júnior. Aliás, o Governo é nosso, é do PAIGC, partido pelo qual fui candidato, por isso ele terá o meu apoio pessoal e institucional para cumprir a legislatura, coisa que nunca aconteceu a um Governo constitucional.”
Pensa manter ou reformular o comando das Forças Armadas, chefiado pelo comandante Zamora Induta?
O nosso sistema é semi-presidencial, com um sofisticado equilíbrio de competências entre orgãos de soberania. Embora o Presidente da República seja o comandante em chefe das Forças Armadas, a escolha das chefias militares, nomeadamente o Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, compete em primeira linha ao Executivo. Assim, o manter ou substituir as chefias militares é uma formulação a ser proposta pelo Governo. E qualquer juízo meu, antecipado, sobre essa matéria pode condicionar a acção do executivo, o que não gostaria de fazer
Como deve a Guiné-Bissau lidar com o problema da pobreza e dos salários em atraso?
A Guiné-Bissau não é um país pobre, é rico em recursos humanos e recursos naturais. É, isso sim, um país subdesenvolvido. O desenvolvimento do país é um desafio que requer o concurso de todas as forças vivas da nação. Por isso, estou empenhado em imprimir uma presidência aberta e de inclusão, onde todos, sem excepção, serão chamados a dar o seu contributo e a assumir as suas responsabilidades. É esta a fórmula, é este o segredo do sucesso.
Como pode o país deixar de ser conotado com múltiplos tráficos, incluindo o de droga, mas também outros?
A conotação é uma questão de imagem. Se é verdade que o nosso país é vítima desse fenómeno [tráfico de droga], não é menos verdade que a qualificação de “narco-Estado” é exagerada. Estamos cientes da existência do problema e estamos empenhados em encetar-lhe um combate sem trégua. Contudo, o sucesso do nosso esforço interno não é suficiente porque, por um lado, não temos meios suficientes e, por outro, o problema não é um exclusivo nosso. Requer uma acção concertada com os países vizinhos e a comunidade internacional. Só assim poderemos minimizar o seu impacto global. A Guiné Bissau não é um país de consumo, é um dos países por onde também passa a droga. Vamos empreender um combate sem tréguas a todos os tráficos nocivos à sociedade e às instituições.
O Presidente e o Governo guineenses vão conseguir manter boas relações com Portugal?
Portugal não é um mero parceiro no concerto das nações, é um país irmão com o qual partilhamos um passado comum. Por isso, entendo que manter as boas relações é pouco ambicioso, vamos intensificar e reforçar as relações quer a nível bilateral quer no plano multilateral, nomeadamente nos fóruns internacionais em que podemos e devemos ter acções concertadas com benefícios mútuos para os nossos países e povos.
E como será o relacionamento com Cabo Verde?
À semelhança do que acontece com Portugal, Cabo Verde está intimamente ligado por laços de sangue com a Guiné-Bissau. Por isso, o sentimento de irmandade que nutrimos fará com que tudo o mais nas nossas relações venha por acréscimo.
Jorge Heitor
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